Fonte: https://flic.kr/p/2j7PvkZ

         Quando uma criança chega à escola, integra em si já um conjunto de competências, nomeadamente, no que diz respeito à linguagem oral, que influencia drasticamente a aprendizagem da linguagem escrita. As crianças aprendem, cada vez mais cedo, a ler e escrever, o que resulta da observação e da interação social com outros adultos e outras crianças, através da realização de atividades, jogos corporais, de histórias e até mesmo da própria rotina, ou seja, podemos considerar que a literacia é prática social e que a criança aprende não só através de jogos, mas também com a sua imaginação.

         Neste sentido, as expressões artísticas assumem especial relevo na forma como atuam como um veículo de conhecimento e desenvolvimento. Há diferentes formas de expressão, seja a música, a dança, a pintura ou até mesmo a escrita  e todas podem ocupar o dia a dia de uma criança; quando esta está a brincar e cria um jogo, concebendo uma história, assumindo papéis, a criança está a desenvolver a sua literacia, está a desenvolver a base que propicia a aprendizagem posterior da literacia emergente, resultante de uma prática educativa mais formal. É essencial, por isso, que nas escolas seja salvaguardado o acesso à livre prática de expressões, de acordo com a autonomia e vontade da criança, para que assim se incentive ao máximo o uso da língua materna por parte das mesmas, independentemente do nível de literacia de cada criança.

       A interação resultante de brincadeiras e jogos é uma interação básica, é o instinto humano no seu estado mais puro. A criança identifica-se com o seu semelhante, observa, entrega o seu corpo à experiência e às sensações, que abrem horizontes e transmitem confiança para dizer através do corpo, de gestos ou de uma personagem, aquilo que pensam ou sentem. No momento da entada na escolarização obrigatória, a infância e os fenómenos educativos que resultam do brincar e das expressões, tornam-se institucionalizados, controlados e regidos pela instituição “escola”, que de forma abrupta, condiciona a atividade e prática da criança, substituindo a expressividade das suas interações, por conteúdos abstratos, que ainda que sejam essenciais, são colocados na perspetiva de que são independentes de todas as restantes aprendizagens. Pelo contrário, as expressões são o elemento basilar de qualquer aprendizagem, sendo até condicionantes dessas e não independentes, pois antes de a criança assumir o seu papel de aluno e aprender a ler, escrever e contar, essa já brincava, já interagia e já comunicava, através da arte (um desenho, uma pintura), mas também quando procurava brincar com os bonecos e lhes dava vida.

         Assim, é também de realçar o importante papel da família, como agentes principais das interações primordiais da criança e que, por isso, devem incentivar e promover condições para que a criança se expresse de forma livre e espontânea, sem que esta se sinta reprimida de alguma forma e assim favorecer o seu crescimento intelectual, humano e social, como ser complexo, autónomo e com múltiplos papéis que é.

       Em suma, quando pensamos em literacia emergente e nos focamos na aprendizagem de uma linguagem escrita, podemos cair na tentativa de considerar que a literacia da criança se começa a desenvolver quando esta inicia a escolaridade obrigatória, mas todas as crianças já possuem literacia, independentemente do nível, do seu contexto social ou ambiente familiar, sendo por isso prioritário que as escolas compreendam esse repertório de competências e a forte - para não referir maioritária - influência das múltiplas expressões nesse desenvolvimento, apostando na flexibilidade e multiplicidade de atividades lúdicas, que permitem, além das expressões, a potencialização da aprendizagem ulterior de conteúdos mais abstratos.

         De forma a ilustrar esta reflexão e a forma como a literacia se pode construir num mundo de expressões, apresentamos este cartaz, de autoria própria, publicado no Flickr.

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Referências: 

Araújo, MJ. & Magalhães, M. (s.d). EMERGÊNCIA(S) DA LITERACIA A JOGAR E A BRINCAR: Um estudo com crianças que frequentam o lº Ciclo do Ensino Básico num agrupamento de escolas em Portugal.

Mata, L. (2017). Literacia Familiar. Webinar DGE. Disponível em  https://webinars.dge.mec.pt/webinar/literacia-familiar

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